Administrador de empresas por formação, ele não sente saudade de sua antiga profissão. Eles (seus colegas executivos) acham o máximo eu ter virado ator. No fundo, as pessoas gostam de ver que alguém teve coragem de fazer o que acredita. Se você acredita, dá certo.
Fotos; Revista TPM/Edição; Fev/2011 nª 106
MATÉRIA DA REVISTA TPM - Ricardo Tozzi
Há cinco anos, o cara sem camisa acima jamais estaria perto do mar, assim, relax. estaria falando economês, comandando equipes de 400 pessoas e lidando com empresários e governadores. Agora, Ricardo Tozzi só quer saber de arte
Ricardo Tozzi, 35 anos, era daqueles executivos “agressivos”. “Trabalhava no mercado financeiro?” “Não, era macroeconomia mesmo”, diz o hoje ator, como se a repórter entendesse a diferença entre os dois! Ricardo era “o cara”. Na Câmara Americana de Comércio – instituição que representa o setor privado frente aos governos brasileiro e americano –, ele era gerente nacional de operações. Na prática, isso significa que vivia em reuniões com os cabeças das empresas associadas, mediando negociações com os governadores de Estado. Trabalhava 11 horas por dia e frequentemente recebia propostas para ganhar mais. “Ofereciam uns R$ 40 mil mensais mais bônus. Isso seis anos atrás”, lembra.
A sua história poderia dar um filme. Sim, essa frase é um clichê. Mas, nesse caso, irresistível. Não é todo dia que a gente cruza com um ator, galã da Globo, com uma história louca (no bom sentido) como esta. Então, vamos voltar ao enredo.
Depois de cinco anos “quebrando tudo”, o moço fez uma viagem para a Europa. “Fiquei só indo a museus”, lembra. Ele sacava que tinha algo de errado em sua vida. “Comecei a ficar doente, e olha que a minha saúde é muito boa. Eu nunca tirava férias e passei a me obrigar a tirar pelo menos um mês por ano.”
E uma revolução começou a ser processada. “Comecei a pintar e fiz uma exposição. Vi que tinha que desenvolver esse lado. Gostava tanto de teatro que parecia um maluco. Ia ver uma comédia com uma namorada e chorava. Ela perguntava: ‘Está chorando por quê?’. Eu respondia: ‘Por causa do trabalho desse cara, olha lá, é impressionante’.”
“Passeia levar uma vida dupla.Não contava para os caras do trabalho que fazia aquilo. Mas comecei a me envolver com o mundo do teatro, a andar todo largado”
O filme continua. Ricardo resolveu fazer teatro. “Pensei assim: ‘É só um hobby’.” E foi estudar na escola Macunaíma. “Passei a levar uma vida dupla. Não contava para os caras do trabalho que fazia aquilo. Mas, ao mesmo tempo, comecei a me envolver muito com o mundo do teatro, a fazer novos amigos, a andar todo largado.”
Lado B
Ele sabia que um dia rasgaria a gravata. “Mas esperei uma coisa concreta. Sou pé no chão e trabalhador. Então, quando fui descoberto em uma peça em São Paulo e convidado para a oficina de atores da Globo, pensei: ‘É o momento’.” Seus pais, de uma tradicional família de Campinas, no interior paulista, quase enfartaram. “Contei para o meu pai por telefone que ia ser ator. Ele respondeu: ‘Sério? Tá bom’. E desligou. Deve ter desmaiado”, ele ri.
E, sim, Ricardo abriu mão dos então dez anos de carreira, das viagens, do carro importado. “Passei a receber 6% do que ganhava.” Deu certo. “De cara fiz Bang Bang [2005/06] e fui tratado com generosidade por todos. Em São Paulo, me conheciam. No Rio, era só um ator começando no meio de outros. E ainda sou, na verdade.”
Mais ou menos. Ele se prepara para um grande papel. Vai interpretar um carioca morador do Vidigal em Insensato Coração. “Fiquei honrado porque o [autor] Gilberto Braga disse que precisava de um ator inteligente para interpretar um cara burro”, ele conta.
Antes disso, ao lado da atriz Barbara Paz, estava em cartaz na capital paulista com a peça Hell, dirigida por Hector Babenco. “Foi maravilhoso, fiquei seis meses com o teatro cheio. São Paulo tem uma cena teatral muito forte, que adoro. Você já foi ao bar dos Parlapatões, na praça Roosevelt? Eu adoro aquilo”, comenta o paulista.
E o que os colegas executivos acham do novo Ricardo? “Acham o máximo. No fundo, as pessoas gostam de ver que alguém teve coragem de fazer o que acredita. Se você acredita, dá certo.” Ele diz isso olhando nos olhos. No estilo sedutor. É fácil imaginá-lo hipnotizando plateias nas palestras que dava quando era economista.
“Quanto mais eu ficar quieto melhor”
Mas isso aqui não é um conto de fadas. E, por isso, nosso personagem não é completamente feliz em seu lugar. “Eu acho ser celebridade uma coisa ridícula”, solta. Ele acha ser famoso, assim, cafona mesmo. E olho para o lugar onde estamos. Leblon, o bairro predileto dos paparazzi, aquele que inspirou Caetano Veloso a escrever a música “Falso Leblon” (em que compara o bairro com o Big Brother).
“Eu moro no Recreio [dos Bandeirantes]. Sou tão paulista que moro perto do trabalho”, ironiza. E explica que marcou a entrevista ali porque sabia que aquele restaurante não era alvo de fotógrafos. “As pessoas aparecem na revista muitas vezes porque querem. Eu sei que se formos na varanda do Celeiro [restaurante do Leblon] seremos fotografados. Então, não vou. Faço o mesmo com estreia de peças.” E ser galã já foi, sim, um problema. “Uma vez terminei um relacionamento e logo depois publicaram a foto da minha ex-namorada jantando com um dos meus melhores amigos. Depois fui saber que eles tinham se encontrado por acaso, mas na hora você já está fragilizado, triste.” E desabafa: “Não gosto nem de dar entrevista, sinceramente, acho horrível”.
Depois dessa, devo confessar que não perguntei se ele estava namorando (ele é ex da atriz Daniele Suzuki). Nem se ele quer ter filhos ou se acredita em fidelidade. Fiquei, sim, com vontade de pedir conselhos sobre economia, mas logo desisti. “Antes eu entrava em sites de economia na hora em que acordava, via todas as cotações do mundo. Agora, consegui desencanar”, diz o cara que “não é dessas coisas de internet”.
“Fiquei honrado porque o [autor] Gilberto Braga disse que precisava de um ator inteligente para interpretar um cara burro”
“Não vou ter Twitter para falar onde estou e depois reclamar da falta de privacidade, como alguns colegas fazem”, alfineta. Ainda argumento que o Twitter é legal para trocar ideia e tal. “Isso sim, mas, no meu caso, quanto mais eu ficar quieto melhor.” Comento que dei um Google em seu nome logo antes de sair de casa e vi que ele era um sucesso entre as adolescentes. “Eu sei. Mas sabe o que faço? Eu nunca dou Google em mim mesmo. Sempre vai ter uma mentira, sempre vão inventar alguma coisa. Para que vou me chatear se posso evitar?”
Ricardo Tozzi sabe das coisas. Só nos resta concordar e simpatizar com o cara.